sexta-feira, 13 de junho de 2008

Um gaio poema about food


The Aluminum Cooking Utensil Co., 1932



O importante é comer

para M. B. de L.

Sim, o importante é comer com os pés
Talvez mais importante seja comer com os olhos
Mas menos desafiador que comer pelos cabelos
Pois o importante é comer com os pelos
E os poros também comem
Como os brutos cotovelos
Ás vezes, comer com a mão
E não com a virilha
Dá algumas espinhas na estampilha

Comer, comer
Com talheres ou chopsticks
Com a mente ou fora de hora
Torna tudo tão comezinho
Quanto a cabidela do meirinho
Ora, por que comer com as mãos
É tão aborrecido e pobrezinho?
Por que não comer uvas
Que antes eram passas?
Não passarão?

Comer água de passarinho
Comer, verbo transitivo
Ah, indigesto ato
Vamos fazer política
Calçar luvas, deitar alpiste
De cima dos Alpes da sandice

Comer está fora de moda
Não há lugar para comer
Tem feijão, arroz, capim?
Não. Só vincas, compromissos éticos
Dilatoriedades, articulações oblíquas
A destruição de toda voz, toda origem
Um mesmo entre os dois
Mas tudo isso só vale pros de casa
Tem macarrão, jojoba, amendoim?
Não. Tem a possibilidade de um devir
Sombra conduzida, evaporação do sentido
Desdobramento do efeito provocado
Astúcia da convicção, ou, quem sabe, pitibiribas.

(Não, pitibiribas, não: a-pitibiribas)

Comer é pequeno
Coisa de meteco
Barthes já dizia
Mas quem comeu Barthes
Ao molho pardo da pós-estruturalia
Hoje escreve apoemas sobre metapoesia
Na mesa da cantina lá da faculdade
Ainda que a faculdade de se perceber um
Lugar para comer ou... descomer
Esteja fora de.

(Arrotadas delicadezas)

que Ainda
Que o de jejuar gesto
lembre Mais ninguém

Não comei, nem bebei
Sem transtextualidade
Ide por mim
Fio-me, confio-me, como-me
Por dentro como por fora
Cheio de dobras deleuzianas

E, só para terminar sem conclusão
Amanhã ou no Maranhão
:
O importante é comer com a mão


Nota - este poema não tem título. Você vê o título. Mas é só sua imaginação. Como dizia Blanchot. Afinal, tudo depende do ponto de vista do leitor. Inclusive a dependência e o leitor. Afora o rei, a nudez, etc.

Um comentário:

  1. jolly, jolly good
    smells like
    post-post-post food
    which ends up
    ancient ambrosia
    que vale devolver
    a carne
    à poesia.

    O que falta à poesia brasileira é poema ruim. Não encontro um poema ruim. Quero ler um, mas está em falta. Todos os poemas parecem bons. Chesterton dizia que grandes escritores escrevem páginas terríveis. Mas escritores medianos só escrevem páginas boas. A poesia brasileira hoje é quase sempre um parnasianismo disfarçado de minimalismo reluzente.

    Mas falta também poemas excelentes. Agora falta menos um, que esse daí é peça rara.

    Abraço!

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