quarta-feira, 11 de março de 2009

Receitas de repetir sem sinestesia e local


Walter de Maria, The Lightening Field, 1977




Cinema Expandido, Fetiche de Vanguarda e Conceitos


Redenção e perdição dos que trabalham com elementos de vanguarda. Falo especificamente de imagens e sons. De imagens e sons produzidos em Fortaleza. Os caras andam sempre hiperbem informados. Se fala por exemplo em “cinema expandido”. Há mérito nisso. Cinema expandido, um conceito mais sistematicamente delineado por Gene Youngblood ainda lá nos distantes anos 70. As premissas experimentais são instigantes, como muito do que busca um caminho á margem do mainstream. Uma salada de vídeo-arte, holografia, efeitos visuais computadorizados, mix de suportes e dispositivos os mais vários, manipulações de imagens e sons onde a música – em resumo, uma espécie de action-music, por analogia a action-painting – detém um papel bastante central. E é muito bom que haja gente empenhada em apropriar-se dessas possibilidades estéticas por aqui. Mas o ponto é também perceber quem desdobrou essas linguagens sob formas e nomes outros, aqui no Brasil. E por vezes até de modo mais efetivo. A música total de Hermeto Pachoal, por exemplo. O problema como sempre é um tanto de fetiche. De deslumbre. O fetiche do novo, dos termos novos, que aportam junto com essas estéticas. Em geral, o perigo é o de tomar essas terminologias esdrúxulas, “fascinantes”, quase sempre como um valor em si. E acabar valorizando-as até mais que os materiais e assuntos tomados para se trabalhar. A ameaça de aborto, ao fim de tudo, é o de elas não constituírem um meio, mas um fim em si mesmas. [Nota: do mesmo modo como muitos deleuzianos se fixam mais na terminologia do que na possível relação de coerência e verdade entre essa re-nomeação e o mundo]. E assim essas terminologias bloqueiam a criação por vedar o relacionamento com contextos e sons locais num grau verdadeiramente profundo, renovador. Essas imagens e sons locais, que, de outra forma, por terem sido excessivamente exploradas por sistemas de produção de signos mais normatizados, se prestam maravilhosamente bem a serem elementos desdobradores de um eventual “cinema expandido”.

E, no entanto, a não ser que aconteça um milagre - e esse milagre passa por uma sensibilidade sagaz o suficiente para incorporar as especificidades locais a esses sistemas vanguardeiros - nosso "cinema expandido" não passará de uma mera cópia do que segue apregoado em livros como os de Youngblood ou em experimentos como os de Walter de Maria, Robert Frank, Carolee Scheneeman, Robert Whitman ou Derek Bailey.




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