quinta-feira, 2 de julho de 2009

Dois avisos avulsos para dizer que não desisto


William Fox Henry Talbot, The Open Door, 1844



* * *

adote o filme
edite os planos
do jeito mais linear
mas com engenho
porque a vida

bem, a vida
anda cheia demais
de falsa arte
de sobrecenho

ao estético, hipoteque
dê uma chance
à vida, à vida só
sem flashback


* * *

Em Memória de Bob Creeley

As leituras de livros específicos soam sempre mais luminosas que as teorias gerais sobre livros. E isso pode ser excelente num tempo em que estamos obcecados, ao paroxismo, com teorias gerais. E com teorias gerais que nos incitam a limar da face da terra a necessidade de ter teorias gerais longe dos livros. Ao modo de convicções. De abrir espaço no mundo. Quer dizer, há um paradoxo, aqui. Mas o crítico que merece o nome, prefere, então, o detalhe. E ao preferir o detalhe, seu olho de lince percebe em meio a cornucópia de objetos que existe, digamos, num estúdio, um deles, que, apesar de estar tão presente, não era notado como algo, em unicidade, longe de fúteis generalidades e teorias: um livro. Um qualquer livro. E, no caso específico, aquele único livro que possuía entre suas páginas, não as teorias gerais que se debatem para acabar com as da moda acadêmica anterior. Porém a luminosa chama da ficção, o condão de manter acesa a vida. O bombear do sangue nas veias. Chama que brota de um solo vulcânico sedimentado por depósitos geológicos que vão, na tradição do Ocidente, reivindicar sua gênese em Cervantes e antes. Ou então, naqueles versos que diziam "mas nos olhos mostrou quanto podia,/ e fez deles um sol, onde se apura/ a luz mais clara que a do claro dia". E, ainda assim, lembra: tudo isso, o mais belo e imprescindível, é ninharia se não endenta na tua fibra, circunstância, dia-a-dia.

Pensar incompletudes, faltas de jeito, desajustes em afetos. Domesticidades. Pingos de urina no vaso. Manchas de mênstruos no Modess. Sobre ficar velho e seguir perdendo um senso gregário. Foram assuntos do poeta. Dignidades de uma porta aberta. Recorrência de palavras sem nobreza. Próximas da fala. Eis algo de Bob Creeley.


* * *


P.S. -- aos leitores, ando apenas sem tempo. Mas a coisa prossegue, na medida. O impossível.


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